Um dos temas explorados nos seis anos de série, foram os famosos “What If’s”, ou seja, aqueles universos alternativos, que nos fazem pensar “E se tivesse ocorrido diferente”. Sem dúvida mudar os eventos dos destinos pode desencadear uma corrente mudanças que alcança uma proporção não imaginável.
Baseada nessa premissa, tive a idéia para esse artigo (às 3 da manhã, debaixo dos cobertores, num frio de 4 graus…oh life) que tratará exatamente uma dessas especulações:
E SE XENA NÃO TIVESSE ACONTECIDO NA DÉCADA DE 90?
E se não tivessemos uma série Xena Warrior Princess até os dias atuais?
E se Xena tivesse sido lançada na década atual?
Existem muitos pontos que podem ser especulados a partir disso, alguns positivos, alguns negativos, mas é inegável que muitas coisas, inclusive a vida de muitos fãs, não seria a mesma (se seria pior ou melhor, jamais saberemos).
Não é, em absoluto, um cenário fácil de se imaginar, já que essa “pequena mudança” no tempo afetaria vários aspectos… A influência de XWP em diversas áreas no decorrer de quase 20 anos, a tecnologia usada, o impacto na mídia, o corpo de atores E profissionais técnicos usados, entre tantas outras coisas. Então, para começar, vamos considerar no que Xena influenciou a nossa sociedade, tanto individualmente quanto coletivamente:
A Influência de Xena no Âmbito Televisivo
Ainda que muitos batam o pé quanto a isso, há de se reconhecer que Xena foi o marco inicial de uma revolução na caracterização feminina em produções televisivas de ação no Ocidente, afinal, diferente de suas antecessoras como Sheena, Charlie’s Angels e Wonder Woman, a nossa princesa guerreira não demonstrava NENHUMA dependência em figuras masculinas ou super-poder de qualquer origem. Ou seja, Xena era dona do seu destino e badass por si só, e embora tenha trazido cenas que emanassem sensualidade, o foco da série nunca foi mostrar mulheres de biquíni lustrosas de suor chutando bundas em poses sensuais, como algumas produções que a precederam. Outro ponto importante a ser considerado, é que em XWP não temos “a mocinha da história lutando contra o mal”. Temos uma Anti-Heroína, atormentada por atrocidades cometidas num passado banhado à ódio, sangue e sede de vingança, que tenta reparar uma pequena parte do mal que cometeu, embora no seu âmago ela saiba que jamais conseguirá se perdoar ou ser perdoada. Temos uma personagem que apesar de ter se arrependido, e se voltado ao lado do bem, eventualmente libera seu lado negro, se mostra arrogante, estoica, deixando-se levar pela raiva e pela vingança, e precisando de uma bússola moral (Gabrielle) pra que não caia novamente no caminho das trevas. E uma personagem, que não faz questão de ser amada, mas muito ao contrário, não se acha digna de amor ou gratidão das pessoas.
Dito isso, vamos então puxar pela memória e ver afinal, que influências foram essas que Xena teve na TV da década de 90 até os dias de hoje.
Xena foi creditada por muitos (incluindo pelo próprio Joss Whedon, que deve ter se roído pra admitir isso) como uma série que abriu um caminho mais fácil de ser percorrido para muitas personagens femininas da ação. Alguns exemplos do que sucedeu a série, ainda na década de 90, foi a aclamada Buffy The Vampire Slayer, lançada dois anos mais tarde em 1997. Epa, mas espera aí! Já havia um filme de Buffy em 1990, o nosso caro fã vampiresco pode dizer. E é evidente que eu não esqueci desse detalhe, mas vamos refletir: Após um filme frustrado no início da década, será que Joss Whedon teria reunido coragem e inspiração para reviver a personagem sete anos depois, se o ambiente não estivesse propício para tal? E mais, será que a indústria televisiva, a qual bem sabemos, é movida à dólares, teria lhe dado o aval, se não houvesse um campo de segurança criado por Xena dois anos antes? Mas afinal, se tudo se tratava de coragem e liberação de verba, o que providenciou esses elementos à Robert Tapert e John Scullian?
Para responder isso, temos que fazer conjecturas baseadas em mais de um elemento. Primeiro, consideremos a grande paixão de Tapert pelas produções de Hong Kong, onde figuras orientais femininas arrebentando dentes e ossos dos inimigos eram e ainda são bastante comuns. Paixão essa, que fez com XWP se tornasse uma salada repleta de referências à filmes orientais clássicos como Tai Ji Quan, The East is Red, Drunk Master, Once Upon a Time in China, Fong Sai Yuk, The Bride with White Hair e Dragon’s Inn. É claro que só paixão não faz milagres, e nesse ponto tenho que dizer que devemos à Hercules The Legendary Journeys uma porta aberta (ainda que eu e 90% do xenaverse torçamos o nariz para o seboso herói grego interpretado por Kevin Sorbo), já que a série sendo ambientada num contexto fantástico-mitológico, fez com que se tornasse mais fácil uma série com a mesma temática ser emplacada.
É claro que isso por si só não resolvia todos os problemas dos nossos corajosos produtores, o próprio Robert Tapert nos contou numa entrevista ao Whoosh a reação de seu colega, Sam Raimi, ao escutar sua nova proposta.
“You just can’t do a female superhero show. It’s not gonna work!”
“Você não pode simplesmente criar uma série com um super herói feminino. Não vai dar certo!”
Gosto de imaginar que Robert deve ter respondido com um sonoro “watch me“, mas o fato é que FELIZMENTE ele não deu ouvidos ao mau agoro do amigo de infância e incentivado por Dan Fillie, um dos técnicos da Universal (tão louco quanto Tapert) fizeram os primeiros planos para Xena (que a princípio se chamaria Bekka, mas felizmente um amigo dos dois os aconselhou que “qualquer coisa que tenha a letra X envolvida chama a atenção das pessoas”). John Schullian se juntou ao bolo, planejando beleza e sensualidade para a heroína, o que foi mesclado aos planos de poder, ferocidade e ímpeto vindos da mente de Tapert, e assim nasceu Xena, engatinhando com as sobras de cenário de Hercules the Legendary Journeys, mas ganhando o coração do público. Ignoremos o fato de que inicialmente alguém na produção teve a idéia de jerico de imaginar Xena viajando ao lado de “PAN, o ginasta acrobata da floresta” e lutando com o poderoso “Khan, the Great”, felizmente tudo tem limite, até a loucura dos TPTB.
Mas voltando ao cenário pós-Xena, além de muito provavelmente ter reaberto as portas para a loirinha adolescente caça-vampiros, Xena também deixou a estrada livre para personagens tanto da ação quanto da fantasia, como Dark Angel, Sydney Bristow, Starbuck, a volta de La Femme Nikita, as bruxas de Charmed, e é claro, a adorada Noiva de Kill Bill (sendo Tarantino um fã entusiasta de Xena e seus temas de vingança). E já que citamos A Noiva e Starbuck, que não são séries noventistas, podemos também incluir na lista, o recente reboot de Nikita e Lost Girl (essa última, que evidentemente bebeu muito da fonte de Xena e Buffy). Sem contar, o recente filme Colombiana, que faz menção direta à força e poder da princesa guerreira, admirada pela pequena Cataleya.
Então, excluindo Xena lá de 1995, fica difícil repensar ou sequer imaginar o cenário das heroínas de ação das últimas duas décadas. Será que teríamos tantas personagens fortes tanto na TV quanto no cinema? Ou será que o cenário feminino no gênero da ação ainda estaria engatinhando, com filmes não tão conceituados como Elektra, Aeon Flux, Ultraviolet e outros similares?
Mas a influência da alta morena de cabelos longos e olhos azuis não para por aí. Partindo para o lado mais técnico da situação, podemos supor que sem Xena iniciando lá em 1995, talvez produções consagradas como Kill Bill e Lord of the Rings tivessem sido levemente modificadas. Mas como assim?
Zoe Bell
Para quem não sabe (ainda existe alguém?) uma das mais talentosas dublês de Xena, Zoe Bell, foi também a dublê de Bellatrix Kiddo, a Noiva sedenta de vingança. E se a Noiva teve as acrobacias e movimentos de luta que teve, tão peculiares e perfeccionistas, é porque foi em Xena que Zoe pôde brilhar e impressionar inicialmente. Não tenho a pretensão de dizer que Kill Bill teria sido pior com outra dublê (se é que teria existido, sendo Tarantino um entusiasta de Xena por sua história de vingança), mas é evidente que se mexermos em um elemento de todo esse conjunto que forma um filme, a obra sofreria alterações, pois cada profissional tem sua particularidade no que diz respeito ao trabalho que executa.
Me arrisco a dizer que Lord of the Rings cairia na mesma situação, pelo menos no que diz respeito à indumentária de elfos e guerreiros do filme. Qualquer xenite mais observador que tenha babado no figurino de XWP nos 5 primeiros anos da série, deve agradecer a uma profissional em especial pelos vestidos, couros e outras peças de vestuário da série, a figurinista Ngila Dickson, que após seu trabalho notável em Xena Warrior Princess, foi “roubada” do xenaverse pelos produtores de Lord of the Rings!
Mas vamos viajar só mais um pouquinho? Se tem algum fã de Sillent Hill (jogos e filme) presente, que levante a mão! Quem já jogou pelo menos um dos títulos da macabra série, deve ter ouvido em sua trilha sonora (nas poucas faixas vocais de cada volume) uma voz poderosa e cheia de talento se juntando aos arranjos de Akira Yamaoka. Essa voz atende pelo nome de Mary Elizabeth McGlynn, e o que essa pessoa tem a ver com Xena, eu já lhes explicarei.
Lá na primeira temporada da série, teve aquele episódio quase esquecido da Pandora, não é verdade? Mary Elizabeth é a própria Pandora, que durante as filmagens do episódio sofreu um pequeno acidente e quebrou a perna. Isso fez com que ela passasse alguns meses de molho, e para matar o tempo, ela começou a estudar dublagem de videogames, e acabou entrando de cabeça nessa carreira. Posteriormente se tornou não apenas dubladora, mas diretora de dublagem de muitos títulos famosos como Resident Evil 4 e 5, Final Fantasy VII, Devil May Cry e Castlevania. Além de ter trabalho em vários animes. A própria artista admite, que embora na época parecesse azar, ter quebrado a perna durante Xena, foi a melhor coisa que lhe ocorreu profissionalmente!
O lado…colorido da influência
Mas o que a ausência de XWP lá em 1995 teria afetado não se limita ao gênero da ação e questões técnicas. Para algumas pessoas, assistir Xena era libertador, e aqui eu trato de uma parcela em especial do fandom, a parcela LGBT.
Antes de 1995, não havia nenhuma série de TV que lidasse com temas gays e se fizesse tão mainstream na mídia. Existiam filmes, é verdade, contudo a maioria deles, pouco conhecidos. A carência de um produto assim, que não fizesse um big deal da questão sexualidade, fez com que essa parcela de fãs começasse a “shippar”1 Xena e Gabrielle, afinal não se tinha visto até então na tv, uma mulher forte, independente que tivesse como companhia constante uma tagarela contadora de histórias que largou família e noivo para trás para viver aventuras ao lado de uma guerreira. Os produtores entraram na brincadeira e começaram a inserir os famosos subtextos na série, ou seja, o discurso, seja verbal ou visual, gay inserido nas entrelinhas. É verdade que as vezes esse discurso rompia a barreira das entrelinhas e se tornava bastante óbvio, mas logo os TPTB2 levavam uns puxões de orelha da Universal e tinham que andar na linha novamente, afinal, eram os anos 90. Podia-se chocar, mas só até certo ponto, para não perder espectadores. A solução encontrada foi enfiar o termo “almas gêmeas” na história. Xena e Gabrielle eram almas gêmeas, ponto. Se elas tinham um relacionamento romântico ou não, ficava para os fãs interpretarem. Mas é bem verdade que os fãs adeptos ao subtexto, os famosos subbers3 tinham uma bela ajuda vinda de alguns roteiristas em especial, como Steven Sears, Chris Manheim, Katherine Fugate e o próprio Tapert, que sempre achavam um jeitinho especial de driblar a vigilância da Universal, enquanto outros roteiristas como R J Stewart, davam chiliquinhos e diziam que o show precisava se mostrar mais heteronormativo, fazendo a alegria dos chamados shippers3.
Mas o fato é que, mesmo tendo ficado em cima do muro por muito tempo, termos como “GAY!”, “almas gêmeas apaixonadas” entre outros, inevitavelmente saíram da boca da produção (mesmo nem precisando, afinal os subbers já estavam bem convencidos) e isso fez com que Xena se tornasse um ícone. Não apenas por inserir esse famoso subtexto entre as protagonistas, mas também por nos trazer personagens como Miss Artiphys, a miss transexual interpretada pelo transexual na vida real Geoff Gann (Karen Dior), Jace, o colorido e entusiasmado irmão dançarino de Joxer, Vidalus, Calígula, interpretado pela diva Alexis Arquette e uma versão de Brunhilda toda apaixonadinha por Gabrielle.
Lucy Lawless e Karen Dior
Ainda que haja quem critique Robert Tapert, acusando-o de não ter tido a mesma coragem de Joss Whedon nesse sentido, o qual inseriu em Buffy um casal abertamente gay, Tara e Willow, há de se convir que vários fatores favoreceram o lado de Whedon, sendo seguro dizer que um desses fatores muito provavelmente seja, novamente, o campo de segurança e tolerância, que vinha sendo instalado por XWP. Além disso, XWP e BTVS, são séries de igual impacto mas com moldes diferentes, ainda que tenham incontáveis semelhanças (sejam coincidências ou não). XENA, foi uma série muito mais nuclear, ou seja, centrada em duas personagens, ainda que eventualmente os coadjuvantes aparecessem. O núcleo fixo de Buffy (até por ela ser uma adolescente, e não uma viajante) era bem maior, ou seja, toda a atenção obviamente não cairia somente sobre Tara e Willow.
O fato é que é inegável que para existirem produções como Queer as Folk, The L Word, Lip Service, e séries não temáticas, mas onde existem personagens gays tratados de maneira natural, como O.C, Once and Again, Skins, Pretty Little Liars e Glee, foi necessário que alguém desse o pontapé inicial anos antes. Pontapé esse dado com uma bota de couro, se é que me entendem. Se excluirmos esse marco inicial lá de 1995, só teríamos esse pontapé dado em 2000, por Tara e Willow, se tivéssemos sorte de elas terem existido.
É verdade que a XENA de 2012, teria mais liberdade no que diz respeito a subtexto, mas aí vale refletir… será que a série não acabaria se tornando banal, se focada em demasia nesse aspecto? Não apenas isso ocorreria, mas haveria uma diminuição considerável no número de espectadores, afinal os shippers acabariam desmotivados.
A Magia dos anos 90
Ah, a nostalgia que essa década me traz! Na década de 90, certamente as famílias eram mais unidas e muitos se sentavam na frente da TV ao fim de tarde para assistir Xena lidando com o vilão da semana. O ambiente virtual de livre acesso à todos ainda dava seus primeiros passos. Internet era privilégio de quem tinha muito dinheiro, e ainda assim, era se sujeitar a uma conexão com velocidade mínima! Nada de downloads de episódios! Nada de Amazon.Com! Poucos eram os fóruns de discussão, AOL era ainda um império e Ausxip e Whoosh eram bebês recém-nascidos. Ou seja, diferente de como ocorre com as séries de hoje, a maior parte da divulgação do seriado se fazia por via televisiva ou impressa, e não virtual. Por volta de 1996, que timidamente grupos de discussão e sites de informação sobre XWP começavam a se formar, e aí, meus caros xenites, eu, que só assisti Xena por completo em 2006, lhes digo que sinto saudade de algo que não vivi. Que delícia deve ter sido fazer parte daquelas comunidades alvoroçadas por episódios inéditos, criando mil teorias baseadas nos poucos spoilers que saíam, se emocionando com arcos dramáticos, e xingando muito no twitter os roteiristas pelas eventuais bananadas.
Naquela época, felizmente, o maior inimigo de qualquer protagonista da TV eram os vilões das próprias séries e não o risco eminente de cancelamento, do qual sofrem TANTAS séries hoje (NÉ DONA ABC STUDIOS). Séries na maior parte das vezes, eram terminadas , e não cortadas no meio por questões de audiência, como se a culpa fosse dos próprios fãs.
O público, era mais “inocente” não se deixando seduzir por efeitos especiais caríssimos, e se deixando cativar pelo puro e simples roteiro, que fazia rir, chorar e suspirar. Afinal, quem precisa de bullet time slow motion quando o próprio script se garante para prender a atenção dos fãs?
E foi nesse ambiente que Xena nasceu e rapidamente se consolidou como um fandom detentor de milhares e milhares de fãs ao redor do mundo, se tornando uma das séries de maior destaque dos anos 90. Um verdadeiro mito! Bonecas, camisetas, chaveiros, inúmeras revistas, kits de fanclub com vídeos em VHS, clube de fotos. Rapidamente essa história de redenção superou até seu programa de origem, deixando Kevin Sorbo dando altos pitis por “Xena ter lhe roubado tudo”.
E olha que o canal de origem, o fossilizado USA CHANNEL tinha o maior respeito pela série, promovendo vídeos de divulgação super caprichados, maratonas, especiais entre outros mimos para os fãs. Que série hoje em dia, por mais bem sucedida, tem tudo isso? E pasmem! A ordem dos episódios era respeitada. Sim, isso é surpreendente, se acompanharmos o histórico de uma certa emissora que bateu o RECORD em pulos de episódios, troca de ordem, cortes de cenas entre outras bananadas sem justificativa.
Há quem ache que se Xena tivesse sido produzida nos dias atuais, teríamos a vantagem de efeitos especiais mais caprichados, por causa de um provável orçamento mais confortável e da evolução tecnológica, mas será que a série teria adquirido o império de fãs que conseguiu? Talvez seja característica própria aos xenites se mostrarem tão entusiastas e apaixonados, mas eu não vejo esse tipo de entusiasmo nos fandoms das séries atuais, por mais que elas sejam GRANDES sucessos do momento. Como disse a Chapo, há algumas semanas, os fandoms de outras séries teriam muita sorte se tivessem um acervo como é o Whoosh, para os xenites. A quem estamos enganando! Os fandoms brasileiros de muitas séries teriam sorte de ter um acervo como é a Revista Xenite, para suas séries! Mas a questão é, que hoje em dia o entusiasmo é passageiro. O mercado atual tem muito mais produções do que o mercado dos anos noventa. Mesmo os maiores sucessos, acabam sendo passageiros, ou caem no desgaste facilmente (pelo amor de todos os deuses, ninguém aguentaria mais temporadas de Smallville). O gênero da fantasia em especial (falando-se de TV, e não cinema), teve um período muito down em meados dos anos 2000, e só voltou a ser explorado com propriedade nos últimos 3 ou 4 anos, com o surgimento de séries como Merlin, Legend of the Seeker, Spartacus, Game of Thrones, entre outras.
Em suma, por mais bem produzida em termos técnicos, de roteiro e de orçamento que Xena fosse HOJE EM DIA, dificilmente teria conquistado a legião de fãs que conquistou tendo “nascido” em 1995. Até porque achar atrizes com a sintonia de Lucy Lawless e Renée O’ Connor, que colocaram o amor pela série acima do estrelismo e se mostraram verdadeiramente apaixonadas por seu trabalho, é algo difícil de ocorrer hoje em dia, e queiramos ou não, Xena em 2012, SERIA com outras atrizes (muito possivelmente, infelizmente, nos padrões de uma Megan Fox da vida, ou algo assim).
Mas e se ela tivesse conquistado mesmo assim?
Aí estaríamos feitos! Porque certamente teríamos uma divulgação massiva. blu rays, games (decentes, não desgraças como o produzido pela Blast), aplicativos de Facebook, e mais uma série de bugigangas pra tomar o dinheiro de fãs apaixonados. As convenções Xenites, as famosas Xenacons, provavelmente ocorreriam a nível mundial e não apenas em território americano. Obviamente, não teríamos os famosos “defeitos especiais” (por outro lado poderíamos ter o abuso de slow motion + aceleração, como ocorre em algumas produções atuais), e talvez, se tivéssemos a sorte de XWP ser produzida por uma HBO da vida, não haveria tanta necessidade de aplicação de efeitos em CGI para criar determinados cenários, já que o canal não poupa dinheiro com viagens para filmar algumas cenas. Mas pra isso durar, teríamos que torcer e muito, pra XWP ser a queridinha de alguma distribuidora, caso contrário, ao menor sinal de queda de audiência, correria risco de não ver a luz do dia na próxima temporada.
A influência social
Ainda que nunca tenha levantado bandeiras feministas ou transformado a série num ringue de briga de sexos, Xena contribuiu muito para o dito “feminismo” no momento em que ninguém questionava a habilidade dela comandar um exército, ou o sonho de Gabrielle de fugir de um casamento arranjado para ir explorar o mundo. Ou seja, tanto as protagonistas quanto as demais mulheres retratadas em Xena eram apenas humanas sem privilégios nem desvantagens, algumas eram guerreiras (como Xena, Callisto, Mavican, Velasca), algumas eram civis (como Helena, Gabrielle no começo, Talassa) , algumas eram sensuais (como Afrodite e a própria Xena), algumas eram sonhadoras (como Gabrielle, Tara, Eris), algumas eram desafiadoras e fortes (como Callisto, Boadiceia, Najara), algumas eram românticas (como Minya, Lila e Genia). E ironicamente num dos únicos episódios onde o tema “guerra dos sexos” é abordado, temos Glaphyra, uma mulher, cheia de preconceitos contra os homens que acaba aprendendo uma lição e vendo que o mundo não se trata de Homens contra Mulheres, mas de Bem contra o Mal. Ou seja, sem ondular bandeiras ou queimar sutiãs, XWP mostra que mulheres podem ser independentes e fortes (sisteeers are doin’ it for theeeemselves), sem necessariamente odiarem homens. E isso deu força para muitas mulheres que adentraram o xenaverse, não apenas para lutar por um lugar ao sol numa sociedade patriarcalista, mas também para lutar contra outro vilões, tão ameaçadores quanto os senhores da Guerra que Xena enfrentava, como por exemplo o câncer de mama. Para ter uma idéia do que me refiro aqui, se tiverem oportunidade leiam a obra “How Xena changed our lives”, uma compilação de depoimentos de fãs feita por Nikki Stratford, que nos faz rir e chorar.
Algumas histórias incluem depoimentos de pessoas que se apoiaram em Xena e Gabrielle em momentos cruciais de suas vidas, como dar o passo inicial para vencer um vício em Vicodin e conseguir superar a abstinência sem ajuda profissional, por falta de dinheiro, ou encontrar a coragem pra se submeter a um transplante de medula. Há também quem tenha encontrado coragem para erguer a cabeça e dar voz aos pensamentos sem medo do que os outros poderão apontar, aqueles que encontraram no seu coração lugar para perdão e ainda outros que conseguiram superar a morte de uma pessoa amada, seja este um melhor amigo, um cônjuge, pais ou irmãos, afinal se Xena levou tantos socos e pontapés da vida, e manteve-se forte, porque não podemos fazer o mesmo?
O fato é que de um modo ou de outro, com maior ou menor intensidade, Xena afetou a vida de muita gente, não apenas no que diz respeito à vida emocional ou saúde, mas também no âmbito profissional. Muitos escritores deram seus primeiros passos escrevendo fanfics4, sendo essas histórias a porta de entrada para uma escrita mais profissional. Há hoje, jornalistas que ingressaram nessa carreira após escreverem artigos para o Whoosh e perceberem que levavam jeito para a coisa. Existem até mesmo artistas gráficos que iniciaram na área brincando no photoshop ou editando vídeos musicais sobre a série, e hoje trabalham em grandes empresas ou até mesmo tem suas pequenas companhias de produção cinematográfica, tudo porque lá atrás, existiu uma série que lhes inspirou o suficiente para tentar expressar sua admiração artisticamente.
Então, eu encerro esse artigo – que já está mais longo do que era pretendido – convidando você leitor xenite a refletir. E na sua vida, o que Xena influenciou? Se você não tivesse passado todos esses anos assistindo a guerreira e a barda erguendo bandidos na porrada e trazendo mensagens filosóficas em cada episódio, você seria a mesma pessoa? Nos conte nos comentários, e aproveite para deixar sua opinião: se Xena fosse uma série inédita hoje, será que teria o mesmo impacto que teve na década de 90?
Um grande abraço a todos!
Glossário
Shippar 1: Apoiar romanticamente um par ficcional.
TPTB 2: The Powers That Be = Os produtores e roteiristas da série.
Subbers e Shippers3: Dentro do contexto da série, subbers, palavra que deriva de “SUBtext”, caracterizam a parcela de fãs que apóiam Xena e Gabrielle como par romântico na série, já os shippers, caracterizam os que acreditam mais fortemente no relacionamento de Xena ou Gabrielle com qualquer outro personagem masculino, como Ares ou Joxer.
Fanfics4: Derivado de Fanfiction. Histórias escritas por fãs que trazem personagens consagrados como protagonistas mas não fazem parte da narrativa oficial de uma obra.
Referências
STAFFORD, Nikki. How Xena Changed Our Lives. Toronto: ECW Press, 2002.
YOUNG, Cathy. What we owe Xena. [online] Setembro de 2005. Disponível em http://www.cathyyoung.net/features/whatweowexena.html
WEISBROT, Robert. The Official Guide to the Xenaverse. New Yourk: Doubleday, 1998.
Whoosh.Org. Disponível em http://www.whoosh.org
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