O dia que a barda não escreveu

Por:


Por Cristiane Penoni

 

 

                Essa fanfic é alt., então, se você não gosta nem da palavra subtexto, não gaste seu tempo lendo isso aqui. 
                .
                Xena, Gabrielle e Ares pertencem a Robert Tapert, Sam Raimi, Universal Studios e blábláblá…

Para entender o texto: as musas são nove, cada uma, com um ramo de influência na literatura, na ciência ou nas artes. Elas são: Calíope (poesia épica), Clio (história), Euterpe (poesia lírica), Melpômene (tragédia), Tersícope (dança e canto), Érato (poesia erótica), Polínia (poesia sacra), Urânia (astronomia) e Talia (comédia).

            -Sabe o que me irrita?
A voz de Gabrielle anunciava que algo não estava bem.
-O que?
-Não conseguir escrever! As palavras simplesmente somem na hora que pego um pergaminho…
Xena sorriu para Gabrielle.
-Não cobre tanto de si mesma… Sua cabeça está cheia de preocupações… É normal que as coisas não funcionem bem de vez em quando.
-Mas, Xena, isso não é normal! Uma barda que não consegue escrever?
-Calma, Gabrielle! Tenha certeza: é só uma fase ruim. Isso passa.

            O dia seguinte começou ensolarado. Gabrielle acordou de mau humor. A noite fora mal dormida, tudo por causa da sua incapacidade temporária de escrever. Ela olhou em volta. Estava sozinha.
-Xena? Xena? XENA?
Ela se levantou, procurando por algo que indicasse onde Xena podia estar. Nada!
-Xena, isso é uma brincadeira? Um teste? A gente já não tinha combinado que você não ia mais me testar? Xena… pára com isso; hoje eu não estou para brincadeiras! Xena? Xena?
Um barulho fez Gabrielle girar nos calcanhares.
-Xen…? ARES!? O que você quer?
-Ora, Gabrielle, é assim que você recebe um velho amigo? Cadê o bom dia? O abraço de boas vindas?
-Ares, hoje eu não estou para brincadeiras… Estou procurando por Xena! 
Os olhos de Gabrielle se iluminaram de uma raiva instantânea.
-Foi você, não foi? Onde está Xena?
-Sabia que chegaríamos a esse ponto… Bom, digamos que Xena nesse momento não pode te atender. 
-Ares, o que você fez com Xena?
-Fiz uma proposta, e ela aceitou. 
-Está mentindo!
-Não, de jeito nenhum. Vamos colocar as coisas assim: você foi convocada pelas musas para participar de um desafio. Alguém andou falando que você escreve melhor que Calíope, Euterpe, Melpômene, Érato, Polínia e Talia. Essas seis musas, mais suas irmãs Clio, Tersícope e Urânia, estão muito furiosas com você, e decidiram que “Gabrielle, a Barda de Potédia” só será absolvida da acusação de blasfêmia se vencer esse desafio literário.
“Nem suspeito quem foi que disse isso, e suspeito menos ainda qual era a sua intenção quando disse isso…”
-E suponho que Xena seja o “incentivo” para que eu participe dessa competição, certo?
-Bom, se você vencer, Xena vai ser libertada e você, absolvida da blasfêmia que seus textos provocaram. Se você perder, Xena passa a ser propriedade do organizador do desafio.
-Que, eu suponho, é um tal “deus da guerra”…
-Exatamente… Então, preparada para o desafio?
Gabrielle fez uma careta, e quis dar a Ares uma resposta malcriada. Respirou fundo.
-Ares… Você… É… Um… Cretino! Aposto que viu que não estou conseguindo escrever, e por isso está me jogando numa prova dessas!
O deus da guerra deu um sorriso maldoso, e apenas disse:
-Está pronta?
-Estou!

            Gabrielle piscou, e assim que abriu os olhos não estava mais no lugar em que dormira. Era um salão amplo e bem iluminado, cheio de esculturas, telas, instrumentos musicais e outros itens artísticos. Nove mulheres estavam paradas diante de um palco.
-Ares, vejo que trouxe a atrevida… Ela está ciente do desafio?
-Completamente, Talia. E ela está pronta para começar agora.
-Eu estou o que? 
-Muito bom. Calíope, diga a ela qual é a prova pela qual ela deve passar.
Uma outra musa se adiantou, pegou um pergaminho em uma redoma de vidro e leu:
-“Aquela que dizem superar o talento
              Das musas, por um desafio passará
              Se vencê-lo, alguém ela libertará
              Porém fácil não será seu mais novo intento.

              Em  único texto, este é dela o desafio,
              Ela deverá as nove musas demonstrar
              Enigma esse que deve rápido decifrar;
              Ouça, para seu bem: que use de sangue frio!

              O tempo corre, olha a boa e velha clepsidra
              Uma hora para escrever é suficiente.
              Tarefa mais complicada que a fera hidra.

              Escreve tu teu melhor, essa é a obrigação
  Prepara-te! Teu desafio é iminente!
              Vence, ou então, tu perdes teu pobre coração!”

Assim que Calíope terminou de ler, um pergaminho surgiu na frente de Gabrielle. O que a musa havia lido ficou pregado na parede, e ao seu lado, um estranho relógio d’água.
-Que comece o desafio!
O relógio começou a se movimentar. Gabrielle estava em choque. Era tão repentino assim? Uma hora? UMA HORA? Havia dias que ela não conseguia escrever mais de dois versos… E agora, a sua vida e a vida de Xena dependiam das suas habilidades de barda.
-Gabrielle!, disse Talia – Seu tempo já está correndo. Não prorrogaremos o tempo da tarefa!
As palavras da musa da comédia não tinham nada de engraçado. Gabrielle pegou o pergaminho e fechou os olhos, tentando pensar no texto que tinha de escrever.
“Em  único texto, este é dela o desafio,
              Ela deverá as nove musas demonstrar…”
“O que querem dizer com isso? O óbvio seria escrever um texto exaltando as Musas, mas me parece que não é isso que elas querem. Será que devo contar uma história na qual as Musas apareçam sob forma de metáforas? É, deve ser isso…”
Ela se preparou para começar o texto:

Os humanos, que a vida vivem
            Sob as leis do Olimpo…

            “Não, isso não está bom…”
Tentou várias vezes escrever, o texto nunca lhe parecia promissor. Nunca vinha aquele sentimento de que o texto seria bom. 
O tempo ia passando e o pergaminho continha apenas frases soltas, sem nexo. Gabrielle se irritava com a situação.
Gabrielle fechou os olhos, mais uma vez. Precisava encontrar em si um tema para o texto.
“Que tema eu uso?…” Um rosto surgiu em sua mente. Os olhos azuis de Xena pareciam estar presentes na sala do desafio.
“Xena…” Uma lágrima de esperança rolou dos olhos de Gabrielle. Ela havia encontrado o tema para seu texto.

            -Acabou o tempo, pequena Gabrielle! Está preparada para enfrentar a ira das Musas?
Gabrielle não respondeu à provocação de Ares.
-Certo, então, vamos começar com isso. Clio…?
A musa chamada assentiu com a cabeça.
-Gabrielle, se passou o tempo do desafio. Você deve ler seu texto, que deve conter a solução do nosso enigma.
Gabrielle inspirou, fechando os olhos, e pensou em Xena.
Começou a ler seu texto:

            “Xena, o que eu poderia dizer?
            As palavras fugiram de mim…
            Todo texto que eu começo
            Sempre falta um pedaço
            E o pedaço que falta
            É a mesma falta
            Que você faz para mim

            Mas então, fecho os olhos
            E de olhos fechados eu sempre vejo
            Os olhos que me guiam
            O rosto que eu amo
            É sempre assim.

            As lutas que vivemos
            As pessoas que ajudamos
            Os senhores das guerras
            E entre eles, o caminho
            Caminho do bem 
            Que aprendo na vida
            O que motiva o herói a seguir em frente
            É o mesmo que me motiva a buscar o bem
            Mas esse caminho só tem valor
            Com você do meu lado.

            Tróia, Roma, Britânia,
            China, Egito…
            Todos terão em seu passado
            A sua presença
            Porque, Xena, seu nome
            Fez toda a diferença.

            Que os deuses e seus devotos
            Reconheçam a honra
            Não dos que na guerra vencem pela força,
            Mas os que a força vencem pelo amor
            Que os templos se iluminem
            Que as estrelas e planetas aceitem
            A verdade das verdades
            Que é o amor que trago em mim.

            Se meus escritos serão cantados…
            Se meus escritos serão esquecidos…
            Se você estiver comigo
            Nada disso vai importar
            Porque é com você que eu choro
            E ás vezes, rio tanto que choro
            E choro tanto que rio
            Mas você está do meu lado
            Se rio
            Se choro.

            Xena, o que eu poderia dizer?
            Sou uma barda sem palavras
            Mas, com você, não me importo com isso
            É só saber que juntas cantaremos
            E dançaremos juntas
            E outras oportunidades para escrever
            Um texto que agora eu não consigo
            Vou ter outras oportunidades.

            Sou Gabrielle, sem palavras
            Palavras sem palavras
            As Musas me observam,
            E então, eu encontro as palavras.
            Termino meu texto.”

Gabrielle terminou de ler, com a garganta apertada. “Péssimo texto, péssimo texto… Que? Elas estão aplaudindo?”
Gabrielle olhou para as Musas e Ares. As nove Musas aplaudiam com entusiasmo, enquanto Ares olhava com uma expressão de incredulidade.
-Parabéns! Que texto inovador, que coragem de usar versos sem métrica, sem rimas, sem nexo de vez em quando…Realmente, Gabrielle, você tem um dom inigualável! – disse uma musa.
-Moderno! É isso que é! Esse texto é moderno!
-Que… quer dizer que eu venci o desafio?
-O desafio era escrever um texto que exaltasse a nós, as Musas. – Disse Calíope- Você não fez isso. 
“Droga… era óbvio demais!”
-Contudo, Gabrielle, você provou que possui uma genialidade incrível para os textos. Pena que esse tipo de texto só vai ser bem aceito daqui a muitos anos no futuro, onde existirão coisas com as quais os mortais nem sonham hoje. Essa época vai ficar conhecida como Modernismo, e muitas inovações literárias surgirão. Até lá, eu sugiro, continue usando versos metrificados e que rimem. Porém, por sua genialidade, você está absolvida do crime de blasfêmia. Ares –a Musa se dirigiu ao deus da guerra – liberte Xena!
Ares desapareceu, e uma das Musas perguntou:
-Gabrielle, como se chama esse texto?
-O dia que a barda não escreveu.
-Por que? Você escreveu o texto.
-Sim, eu escrevi. Mas não foi a Gabrielle barda que escreveu. 
-Então, qual Gabrielle é a autora?
Gabrielle apenas sorriu.

            -XENA! Quer dizer que você sabia que eu seria capaz de vencer o desafio?
-Claro, Gabrielle. Como eu disse, era uma fase ruim. E as fases sempre passam. Quando Ares veio me propor que eu aceitasse ser a garantia do desafio, eu sabia que ele tinha conhecimento que você não estava conseguindo escrever. Mas eu confiei em você, e na sua capacidade, que seria recuperada assim que você realmente precisasse usá-la. Foi exatamente o que aconteceu. Eu sabia que ia ser assim, porque eu confio em você.
Gabrielle ficou pensativa. Xena lia o pergaminho do desafio.
-Se não foi a barda que escreveu, quem escreveu?
-A Gabrielle que confia em você.

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