Uma heroína da cor do arco-íris… literalmente
Por: ABarda
Na edição de junho, a Chapo fez um artigo dedicado a dois eventos LGBT no mundo dos quadrinhos: o casamento do herói Estrela Polar com seu parceiro, Kyle Jinadu, na Marvel, e o Lanterna Verde saindo do armário, na DC. Isso me deu vontade de escrever sobre a minha heroína favorita do mundo dos quadrinhos. Então, xenites e leitores esporádicos da RX, conheçam Karolina Dean, uma das heroínas mais coloridas da Marvel. Mas, atenção! Esse artigo contém spoilers de “Fugitivos” (Runaways).
O início
Karolina levava uma vida relativamente normal para os padrões de Los Angeles. Ela era filha de Leslie e Frank Dean, astros de Hollywood, que uma vez por ano se reuniam com mais 5 casais para discutir projetos filantrópicos… pelo menos, era isso que eles diziam. Quando Karolina tinha 16 anos, ela e os filhos dos outros casais (Alex Wilder, Nico Minoru, Gert Yorkes, Chase Stein e Molly Hayes) descobriram a verdade sobre os encontros anuais de seus pais: os adultos faziam parte de uma organização conhecida como “O Orgulho” (The Pride -e, não, não é The Gay Pride), e que, ao invés de praticarem caridade, eles sacrificavam vítimas em nome de criaturas antigas, os Gibborim. A ideia era acabar com a raça humana e começar tudo de novo… O plano de sempre, sabe como é.
Os seis adolescentes tentam avisar as autoridades sobre os crimes que suas famílias estavam cometendo… só para descobrir que ligar para a polícia de Los Angeles dizendo que seus pais são super-vilões é considerado trote. Eles então decidem fugir de casa e tentar impedir o Orgulho e suas atividades maléficas. Na fuga, acabam descobrindo algumas coisinhas, como o fato dos pais de Nico serem feiticeiros e dela mesma ser capaz de praticar magia. Ou que Molly, com apenas 11 anos, é uma mutante dona de uma super-força que a torna capaz de dar uma surra no Wolverine (sim, aconteceu).
Já Karolina descobre que ela e seus pais pertencem à raça dos majesdanianos, extraterrestres luminosos, iridescentes e visualmente fluidos, muitas vezes com ondas de luz colorida girando em volta do corpo que tem forma humanoide. Karolina também descobre que, é capaz de disparar raios de luz, e que seu sangue é composto de luz solar, o que inviabiliza um ataque de vampiro.
Mas, peraí: como é que ela não sabia que era um arco-íris ambulante? Bom, quando Karolina era criança, ela foi “diagnosticada” como alérgica à penicilina, e passou a usar um bracelete médico, que indicava isso… O tal bracelete era feito de um tipo de metal alienígena que suprimia os poderes majesdanianos da jovem Dean.
Depois de fugirem, os adolescentes começam a morar num esconderijo, o “Albergue”, onde escolhem seus codinomes -Karolina se decide por “Lucy in the Sky”- e se preparam enfrentar o Orgulho. Entre a fuga e a batalha final contra os progenitores vilões, muitas coisas acontecem, não só no ramo heroico. Vemos, por exemplo, como os Fugitivos se organizam como grupo. Karolina aparece como aquela que, apesar de ter super-poderes, tenta resolver os conflitos através do diálogo ao invés de partir pra briga, em algumas atitudes bem Gabrielle. Além disso, ela é leal aos amigos e diversas vezes ela se coloca em risco para garantir que os outros consigam escapa (lembram que eu falei de um ataque de vampiro? Pois é, Lucy in the Sky arriscou seu pescoço -literalmente- pelos outros Fugitivos.).
“No, not Alex.”
Desde a primeira edição de Fugitivos, temos algumas pistas sobre a sexualidade de Karolina. Ela está sempre elogiando a feiticeira Nico, dizendo que a acha muito sexy, e querendo ficar perto dela. Mas até então, isso poderia ser visto só como admiração. A situação muda na edição n.º 9, quando Topher, um outro filho de vilões que foi acolhido pelos Fugitivos, encontra Karolina sentada sozinha, à beira do choro, e a garota confessa que tem algo de errado consigo…
Esse foi o momento que fez os leitores mais desavisados começarem a se questionar: “será que a Karolina é gay?”, porque nada indicava que a tal “pessoa” fosse Chase… Topher chega a perguntar se é por ele que Karolina está interessada, mas ela nega.
Nas edições seguintes, existem outras referências à possível não-heterossexualidade de Karolina, quase sempre em situações que estão ligadas à forma com que ela se sente em relação a Nico. Todas as vezes que a feiticeira está em perigo, ou dá alguma sugestão nos planos do grupo, Karolina é a primeira a se manifestar. Além disse, quando Chase diz “gay” como xingamento, Karolina o repreende.
O fim do Orgulho e o começo de uma nova vida
Com o passar do tempo, os Fugitivos descobrem que entre eles há um traidor: alguém está repassando informações para o Orgulho. Os jovens começam a desconfiar uns dos outros, e Chase e Gert chegam a acusar Karolina de ser a traidora (mas também acusam Nico e Alex). Porém, como o grupo precisa impedir o Grande Ritual Demoníaco Final do Orgulho Para A Concretização do Plano Supremo dos Gibborim1, todos escolhem deixar as desconfianças de lado e ir atrás dos vilões. No começo da batalha final, Karolina é mais uma vez acusada de ser a traidora e, dessa vez, quem faz a acusação é Nico. Ainda assim, os seis fugitivos vão atrás dos seus pais, e Karolina é a responsável por derrotar sozinha quatro dos 12 membros do Orgulho. A sorte muda quando Alex se revela o traidor e Karolina quase é assassinada por ele– felizmente, Chase é capaz de evitar o pior.
Os Fugitivos derrotam o traidor, o Orgulho e os Gibborim, e, quando todos acham que poderão seguir suas vidas do jeito que bem entendem, aparece o Capitão América para mandar os agora órfãos para lares adotivos ou instituições especiais.
Noiva?
Mas é claro que Karolina sentiria saudade de Nico da vida de heroína… Por esse motivo, ela dá um jeito de entrar em contato com os outros Fugitivos e juntos, os cinco Filhos do Orgulho arranjam um novo esconderijo e começam a proteger a população de Los Angeles -afinal, quase todos os outros heróis da Marvel vivem em Nova York ou arredores, transformando a Costa Oeste em alvo fácil para os vilões.
Karolina continua gostando de Nico, e tem suas esperanças renovadas quando a feiticeira diz que “depois do Alex, eu não quero mais saber de garotos”. Alguns meses mais tarde, ao fazer um pedido para uma estrela cadente, Karolina tenta beijar Nico, mas a feiticeira se assusta, e faz questão de explicar que não é gay. Já Karolina conta a Nico que ela gosta de garotas, e logo em seguida volta à velha crença de que tem algo de errado consigo. Nico até tenta mostrar que não tem problema, mas a conversa é interrompida por uma nave espacial que quase cai em cima das duas heroínas. De dentro da nave sai Xavin, alienígena da raça Skrull, vindo do planeta Tarnax VII, na galáxia de Andrômeda. E Xavin tem uma surpresinha para Karolina: eles são noivos.
Pois é.
Para evitar que os Skrulls atacassem a Terra, os pais de Karolina haviam dado a localização secreta de Majesdane, o planeta natal dos Dean. Para garantir a veracidade da informação, eles ofereceram a própria filha (que na época tinha apenas um ano) em casamento ao jovem filho do Super Skrull…
Xavin explica que Majesdane e Tarnax VII estão em guerra e que o casamento dos dois é a única esperança para a paz. Juntos, eles têm uma chance de mostrar que a convivência amigável entre os dois planetas é possível. No entanto, Karolina confessa que eles não podem se casar porque ela gosta de meninas. A revelação pega todos os Fugitivos de surpresa, mas não causa o mesmo efeito no Skrull.
Xavin convida Karolina para conhecer Majesdane, e a Fugitiva aceita, para tentar impedir a guerra interplanetária. Com o passar dos meses, as duas decidem se casar, já que Karolina se apaixona por sua noiva; Xavin é paciente, educada e romântica -ela até pede para que a Banda Marcial do Império Skrullos2 toque Lucy In The Sky With Diamonds para a primeira dança depois do casamento. Infelizmente, ninguém chega a ouvir essaa versão intergaláctica da música dos Beatles. No grande dia, depois de um desentendimento entre convidados dos dois planetas, os Skrulls explodem Majesdane antes que Karolina e Xavin digam “sim”, e elas fogem de volta para a Terra, bem a tempo de ajudar os Fugitivos a lutar contra um possível retorno do Orgulho e dos Gibborim. A vida não é fácil quando se tem super-poderes alienígenas.
Os pecados dos pais
O tempo passa e os Fugitivos enfrentam novos inimigos. Karolina e Xavin, apesar de serem um dos casais mais fofos da Marvel, algumas vezes são vítimas de preconceito -principalmente quando os Fugitivos vão parar na Nova York de 1907-, mas o amor das duas é mais forte, e o relacionamento delas tem tudo para durar para sempre.
Infelizmente, “para sempre” é uma palavra complicada nos romances dos super-heróis. As duas descobrem isso quando uma nave com majesdanianos chega à Terra para prender Karolina. Os sobreviventes da explosão do planeta querem que Karolina seja levada à justiça, pois ela é filha dos traidores que revelaram para os Skrulls as coordenadas de Majesdane, que estava escondido havia anos. Para os majesdanianos, faz sentido que a jovem seja julgada no lugar dos pais. Já para os Fugitivos, isso é um absurdo, pois Karolina não fez nada contra seu planeta natal. No entanto, as tentativas de proteger a majesdaniana só causa desentendimentos entre os heróis, além de batalhas que têm o potencial para ferir tantos os habitantes da Terra quanto os alienígenas.
Karolina, querendo evitar mais derramamento de sangue, resolve se entregar para os majesdanianos, com esperança de explicar o que aconteceu e demonstrar que, apesar dos pais horríveis que tinha, ela é inocente. Os Fugitivos, é claro, não gostam da solução, mas a única pessoa a fazer algo é Xavin. Depois de um beijo de despedida, a Skrull faz Karolina apagar, e então assume a aparência e o lugar da sua noiva. Xavin planeja usar suas habilidades diplomáticas para livrar Karolina das acusações que os sobreviventes fazem. Além disso, fica subentendido que Xavin sente que tem uma espécie de dívida com Majesdane, já que foram os Skrulls que acabaram com o planeta. Nem Xavin, nem Karolina são, de fato, responsáveis pela tragédia, mas as duas estão dispostas a fazer o que podem para resolver a situação. Eu não consigo deixar de pensar em Xena em A Friend In Need. Xena não é a culpada por aquelas mortes, Akemi que o é -não importa o que almas japonesas digam. Da mesma forma, Karolina não deve ser julgada pela ação dos seus pais, e Xavin não deve ser julgada pela ação dos habitantes do seu planeta.
Ainda assim, Karolina fica na Terra, sem saber onde Xavin está, se é que a Skrull ainda está viva. É preciso seguir em frente, mesmo sem a alienígena que ela ama.
O que vem depois
Mesmo de coração partido, Karolina continua com os Fugitivos, enfrentando os vilões e, algumas vezes, se divertindo com seus amigos, mas é difícil saber muito do que aconteceu depois da partida de Xavin, porque os quadrinhos dos Fugitivos entraram em um hiato apenas 8 edições depois, em novembro de 2009. Desde então, a única coisa que se sabe de Karolina é que ela começou a sair com uma outra heroína, Julie Power, a Arco-Íris do Quarteto Futuro3, em breves aparições na Academia dos Vingadores.
Mas a boa notícia é que a Marvel tem planos para um filme dos Fugitivos, que deve ser lançado em 2014. A notícia fica melhor ainda quando se descobre que Joss Whedon (Buffy, Angel, Os Vingadores…) provavelmente será o diretor. É aguardar para ver.
Se alguém quiser ler os quadrinhos, vocês encontram aqui: Volume 1, Volume 2 e Volume 3. Existem também alguns extras, mas eu só encontrei em inglês. Se alguém se interessar, só pedir nos comentários.
1: Obviamente, esse não é o nome verdadeiro.
2: Banda Marcial do Império Skrull é a minha tradução aproximada para “Skrullos Imperial Marching Band”, não tenho certeza de como é a tradução oficial
3: Quando Julie Power participou do Quarteto Futuro, ela tinha 10 anos, mas quando ela conhece os Fugitivos, Julie tem mais de 20 anos.
A ideia de um filme me empolga bastante. Especialmente por haver a possibilidade do Joss Whedon comandar a produção.
Muito bom o artigo, Cris!
Eu não citei no artigo, mas ele escreveu um dos arcos da história, o da viagem no tempo no final do 2º volume. E como Joss Whedon é um cara genial, esse é um dos melhores arcos de Runaways.
Nossa, mas eu tenho a impressão (impressão, não) que ele sabe lidar muito bem com Girl Power. Não há motivos para duvidar do sucesso de uma produção nesse estilo.
Depois de Vingadores eu não tenho dúvidas que se ele realmente adaptar Runaways, ele vai conseguir.
Cara, como eu ainda não conhecia essa personagem?? É é algo kinda explícito, a homossexualidade e talz…
Ah, só uma crítica construtiva, o artigo ficou um pouco longo, é capaz de xenites preguiçosos não lerem tudo isso. Eu mesma já escrevi coisas gigantescas e ninguém se deu ao trabalho de ler e depois comentar. =/
É, eu sei disso. O artigo estava maior, eu tentei resumir ele o máximo possível… Mas não deu.
Obrigada pela crítica
Ouço as pessoas falando com tanta paixão sobre “xavolina” no tumblr que me dá vontade de conferir. O problema é que eu realmente não sou uma “comic person”, mas esse artigo me deu uma motivada a mais a conhecer a história.
O triste é essa coisa de personagens que somem sem rumo ignorado que parece um karma em alguns fandoms, e pelo jeito em Runaways também ¬¬
Mas o artigo está muito bom, mesmo longo, prende do começo ao fim.
Valeu Cris!
Marvel mexe comigo há anos. E qual foi minha surpresa ao descobrir o Estrela Polar no meio da equipe? (Mesmo que, edições mais tarde, um Wolverine louco tenha matado o herói – o que me pareceu uma indireta homofóbica pra “o nosso herói mais famoso matou o viadinho”).
Maaaaaas, falando em Karolina, essa eu não conhecia. Acho fantástico esse tipo de material que para na mão de adolescentes e que fala de amar alguém do mesmo sexo com naturalidade.
Parabéns pelo artigo, e os spoilers não atrapalharam em nada! Beijos!
Adoro comics, tanto a Marvel quanto a DC, mas não sou uma aficcionada, então conheço apenas o “básico”, digamos. Sou uma leitora assídua de mangás, mas não de HQs.
Não conhecia Os Fugitivos, mas fiquei muito interessada mesmo na história, não apenas pelas referências homossexuais, mas pelas superações de Karolina, pela amizade do grupo, e mesmo a condição dela me interessou. A ideia de ser como um arco-íris me parece interessante.
E falando em personagens “coloridas”, me lembrou da minha favorita. A BatWoman, que muitos conhecem só de nome. Ela é praticamente a versão feminina do Bruce Wayne. Bem sucedida, bonita e, bem, com ótimo gosto para mulheres haha E foi relançada pela DC Comics em 2006.
Se tem uma coisa na natureza que eu gosto são os arco-íris! E saber que tem heróis baseados nele me deixa bem gay, digo, alegre! Ainda mais quando o lance é regado a subtexto e maintexto!
Belo artigo feito por belas mãos!