Saindo do Armário
Por: Robson Mechlowicz
Por Robson Cardoso dos Santos
Uma tarefa para guerreiros
A expressão
Se é que ainda existe alguém que não saiba, “sair do armário” é a expressão utilizada para designar o ato de libertação a que os homossexuais se entregam ao assumirem abertamente sua opção sexual. Deixam, portanto, de serem enrustidos.
A atração
Sim, nós homens podemos sentir atração por outros homens, e vocês mulheres podem ferver de desejo por outras mulheres. Isso nos torna o quê? Pervertidos? Doentes? E eu rebato com uma pergunta: se ser homossexual fosse uma escolha nossa, por que escolheríamos bancar o papel de sacanas e doentes mentais, sofrendo o preconceito da sociedade? Complexo de mártir, seria?
Atração é o jogo de nossos hormônios aditivando nossos instintos, e nem sempre vemos a magia trabalhando no corpo do sexo oposto, e sim no nosso igual. Sabemos que na visão biológica/anatômica da coisa, o certo é um envolvimento de sexos opostos. Mas para muitas pessoas, um relacionamento não implica apenas em possibilitar uma procriação. E nem sempre o fator físico está ligado ao emocional.
Por que permanecer no armário?
Quando a pessoa chega à puberdade, pode muitas vezes ficar em conflito consigo mesma, a respeito de seus desejos sexuais. Nos focando nos homossexuais, esta pessoa pode ter apresentado, ainda mesmo em sua infância, vestígios de que viria a ser gay em sua vida adulta. E, querendo ou não, nossa sexualidade é peça-chave do dia-a-dia de um ser social. Não vivemos numa crisálida. Quem nunca foi abordado por uma titia-coruja que, ao apertar-nos as bochechas, bradava: “Então, cadê a namorada?” E nossa cara de tomate mal sabia articular uma resposta, e quando esta sonava, era sempre uma mentira cuidadosamente lapidada.
Viver no armário pode ser confortável para essas pessoas que acabaram de atingir a adolescência, só que isso vai pesando à medida que percebem que precisarão de muito jogo de cintura para omitir e mentir sobre sua vida íntima. Ou incorporam uma personagem fictícia e andam com tribos héteros para sustentarem a imagem que a família (e a sociedade) espera deles, ou param de enxergarem-se através dos olhos dos outros e arrombam logo de uma vez a porta do armário. Muito homossexual enrustido permanece assim porque aprende sozinho e por pressão a deixar de lado seus sentimentos e instintos justamente por associarem o significado de instinto a uma coisa “animal” e, portanto, irracional, ingenuamente alheios à realidade de que instinto, sim, é uma chama impulsiva de nosso ser, mas que ele também se deixa guiar por questões do coração, como a emoção, o amor, e não apenas pelo sexo cru.
Homossexual não é um bicho que, por pura rebeldia, resolve experimentar sensações com o sexo igual ao seu. Aí repito, a fim de reforçar, por que Tártarus iríamos querer chamar atenção para uma vertente tão pessoal de nossa personalidade? Pra que iríamos mergulhar em algo que tanto nos exige esforço olímpico para nos mantermos na superfície? Longe de nós querermos chamar a atenção pra cima de nós a respeito de nossa sexualidade, essa coisa tão íntima que não carece de anúncio em público.
É tanto desgaste para se aceitar, e para convencer pais e amigos de que continuamos a mesma pessoa, apenas com uma face de nós que eles nunca pensaram que poderia se manifestar de forma diferente. Somos homossexuais, mas esta é apenas uma das camadas da nossa personalidade, e não necessita de dedos apontados e olhares chocados por parte da sociedade. Por que quando alguém sai do armário, esta pessoa se torna apenas “aquilo”? Ninguém mais te enxerga pelos teus talentos, pelas outras facetas da tua vida. Você se consagra como o alvo de fofocas e piadinhas grosseiras. E isso deve-se a quê? Ao furor que as pessoas têm de definirem a sexualidade como uma faca de dois gumes, ou a pessoa é macho ou é dona-de-casa submissa, sem um muro no meio no qual se possa subir.
Sufoco e necessidade de se assumir
O homossexual vê meninos e meninas de mãos dadas caminhando no parque, no shopping, e mesmo sabendo que nunca teria coragem para andar por aí igual a eles, só que com alguém do mesmo sexo que o seu, impera nele o desejo de poder ao menos sair na rua de cara limpa, sem máscaras. Sofrimento por sofrimento, privação por privação, todo homossexual sonha em ao menos poder estar mais perto da realidade feliz que pertence aos héteros.
Nem todo homossexual apresenta características do sexo oposto em seus gestos e em sua voz, embora quase sempre seus gostos pessoais denunciem alguma “falha”. Um homem que curte Britney Spears ou uma mulher fanática por futebol, por exemplo. E o fato de uma lésbica não se comportar como “machorra” e ser completamente feminina, e um cara não sair por aí desmunhecando, isso não significa que essas criaturas não sofrem o aperto do armário. Por quanto tempo um gay masculino e uma lésbica feminina agüentariam desempenhar um personagem? Só porque o cara não tem trejeitos femininos significa que ele é um hétero que adoraria estar marchando por aí com uma mulher debaixo de cada braço?
Em síntese: sair do armário é vital para a saúde mental de qualquer gay, seja ele afeminado ou não.
Se assumindo – a revelação
O ideal para todo jovem homossexual seria que ele fosse o portador autêntico da notícia aos pais e familiares. O clima de constrangimento impera quando a família fica sabendo por terceiros, ou vai juntando peças como se a vida social de seu filho estivesse se montando fora dos padrões pudicos.
Pais nunca aceitam logo de cara quando um filho se assume homossexual. Não cabe a mim aqui citar percentuais sobre isso, porque estou tratando de pessoas, não de números. O termo que mais se ouve nesses casos é que os pais se “conformaram”, e isso entristece muito os jovens homossexuais, porque parece que o termo remete à morte de um ente querido. Mas eles devem estar cientes de que não podem exigir uma reação positiva de seus pais, assim como a família também não tem o poder de “curar” o filho.
Como uma pessoa pode ser homossexual
Se somos homossexuais, isso seria fator de uma criação conturbada, margeada por pais ausentes ou violentos? Uma pessoa é homo hoje simplesmente porque acarretou conseqüências de suas vidas passadas? Ou seríamos vítimas de disfunções hormonais, um problema puramente biológico de nosso sistema, o que faz de nós, portanto, “inocentes”?
É ótimo que cada pessoa seja livre para escolher a abordagem que melhor lhe convém para entender por quê existem homossexuais: se é uma questão psicológica, espiritual ou biológica. Acredito, porém, que seja uma barbaridade pensar que um rapaz é homossexual hoje porque ficou brincando de casinha e bonecas quando pequeno. Nem toda menina que é lésbica na vida adulta esteve brincando de carrinho em sua infância, e isso desmistifica a tese de que todo homossexual foi um hétero que teve má criação. É justo pensar que um ser humano foi moldado de forma errada? Isso deveria aplicar-se somente a serial-killers, pedófilos e arruaceiros, que se formaram nos monstros que são por causa de problemas num ambiente familiar desfavorável ao crescimento de uma criança sadia de corpo e mente.
Homossexual não é um projeto que saiu errado e que tem urgência de reparos.
A vida de um homossexual
Ao contrário do que a sociedade com mentalidade de jirico pensa, a vida de um homossexual tem o mesmo solo que a de um hétero. Família, trabalho, lazer. Nem tudo está 24 horas por dia girando em torno da sexualidade. Assim como um hétero tem seus momentos a sós com quem namora, um homo também. Só que quando eles têm esses momentos com seus namoros em público, suas atitudes não podem “dar bandeira”. Não se trata de um gesto nobre de auto-sacrifício que fazemos por sabermos que nem todo mundo está pronto para encarar um casal gay abraçado no shopping: os homossexuais vão além, estão acima disso: são justamente os homossexuais que sabem conviver com as diferenças, coisa a que nem todo hétero se presta.
Estar em público com alguém a quem se pode e ao mesmo tempo não se pode tocar é uma tarefa árdua. E é aqui que me faço chato ao repetir pela terceira vez: será que nos submeteríamos a tanta privação e sofrimento unicamente porque teimamos em sermos diferentes da massa? Se ser “igual” é menos problemático, por que não o somos?
A palavra de Eli
O Amor. Ele move tudo. Não somos rebanhos rumo ao abatedouro, agindo por sede de sexo anômalo com gente do mesmo sexo que o nosso. Muitas coisas nos imantam a outra pessoa: um olhar, um cheiro, um corte de cabelo… Mas será que foi apenas o instinto que nos levou a essa sensação de atração? Será que desde a estaca zero nunca existiu algo trabalhando no volante dos nossos hormônios?
Nosso instinto sexual pode nos deixar atraídos por muita gente…
…mas somente o amor nos prenderá em definitivo a alguém.
A seguir, confiram a mini-entrevista que fiz com Natasha Lee, a xenite do Exército Subber, a respeito dessa delicada porém tão natural temática do homossexualismo.
Quero agradecer a ela por tanta dedicação em suas respostas.