Onde Estão os Bardos?
Por: Robson Mechlowicz
Robson Cardoso dos Santos
Um de meus momentos favoritos de Gabrielle em toda a série é este, de THE RING. Sozinha, ela vai riscando seu pergaminho. Para alguém que gosta de escrever, mas escrever ao modo clássico, com lápis ou caneta sobre uma folha de papel em branco, essa cena é muito significativa. Somos filhos da Era Digital, e muitas pessoas desconhecem a própria caligrafia, de tanto que vivem com os dedos colados num teclado de computador., fazendo piscar caracteres em dados cibernéticos.
Alimentar um diário, quem nunca o fez ou pensou em fazer? Escrever à mão, com aquelas pausas pra calcular bem qual será a próxima frase, pois uma vez que o preto marca o branco, não há como deletar depois.
E o que nos impulsionava a escrever? Mágoas? Planos futuros? Carência da juventude? Nessa cena, Gabrielle escreve sobre sua alma-gêmea que partira em uma missão suicida. Numa escrita carregada da tristeza do abandono e de permanente perda, Gabrielle ia escrevendo, banhada pelo luar. E em determinado momento ela puxa pra junto do rosto seu casaco de pele, para aquecer. E eu sei, eu sei muito bem, que ela não estava apenas protegendo-se do frio da noite. O calafrio que percorreu sua pele parece que nasceu nas entranhas, como uma molécula maldosa que vai crescendo numa espiral, e envenenando a gente com aquela aflição por não sabermos onde está o amor da nossa vida…
É próprio do ser humano imaginar sempre o pior quando um ente querido não manda notícias. Pode ter sido assaltado, pode estar num hospital. Estes não são pensamentos exclusivos de pais que não dormem enquanto o filho adolescente não chega da festa… São pensamentos que afloram em quem “sente”, em quem semeia a agonia de não ter quem ama ao lado, e tais sensações precisam ser colocadas para fora. E a válvula de escape dessas pessoas vem através da escrita. Seja para passar o tempo, seja para desabafar, escrever algo para si próprio, como o diário, é um conforto solidário.
E quem ainda escreve cartas no século XXI? Posso dizer que sou um dos poucos que ainda cultiva esse hábito… Nada mais prazeroso do que receber uma carta de alguém que a escreveu à mão, porque você sabe que outra igual a ela não há. Você se sente especial, e, em resposta, faz alguém se sentir assim também.
Receber uma carta, e a primeira coisa que você faz é levar o envelope e a folha até o nariz, e sorrir diante da gostosa fragrância que seu autor deixou ali…
Parece que vivemos na geração da escassez de poetas… E não estou me referindo aos profissionais, que ganham a vida com isso. Estou falando de todas aquelas pessoas sensíveis como Gabrielle, que absorvem emoções, paisagens, e são capazes de descrevê-las tão bem numa página ao ponto de puxar seus leitores para uma linda fantasia da realidade. Todos temos potencial para enxergar a beleza das coisas, das pessoas, dos lugares, dessa dádiva de vida sempre rotativa e inovadora… Se todos nos permitíssemos sermos tocados pela simplicidade do ambiente ao nosso redor, seríamos pessoas melhores por dentro, seríamos poetas. E ser poeta é cultivar, jamais destruir. E, com agentes assim, o mundo seria um lugar decente de se viver.
O mal da época é que as pessoas são muito técnicas, mecânicas, e perdem seu espirito de aventureiros de sonhos. Desde quando ser romântico, sentimental, sonhador é sinônimo de tolo? Será que tornou-se impossível ser racional ao mesmo tempo em que se permanece humano? E os poucos poetas que ainda respiram nessa era moderna… estão perdendo seu oxigênio. A impressão de que são solitários, estranhos no ninho, apodera-se deles, e a morte de uma legião sensível se dá por decretada.
Certa vez, Gabrielle absorvia maravilhada o aroma de um pergaminho. Cheiro de couro úmido, disse Xena. A Princesa Guerreira não entendia o prazer da arte escrita… a magia, a euforia de registrar uma estória, de contar, de perpetuar legado. E de tornar alguém imortal.
E eu pergunto…
…onde estão os bardos?
Robson
E aí, Robson!n Gostei do artigo. Também cultivo o hábito de mandar cartas pelo correio, para pessoas muito especiais, claro. Já fui chamada de pré-histórica, mas nem ligo. No entanto, é bom saber que não se é a única a cultivar um hábito em desuso. Até a próxima. Márcia
Sinto tanta falta de escrever :/
Eu escrevo,da forma tradicional:lápis ou caneta e papel.Tem gente que acha estranho,daí vem aquela frase “Poe que não escreve no computador e salva?É bem mais fácil,etc.etc.”,mas é que eu não vejo graça nisso.Eu quero mesmo é escrever coisas num caderno,esquecê-lo por longos períodos e voltar a encontrá-lo,como fiz tantas vezes,pensando “Nossa,olha só o que eu pensava quando era mais jovem!”,ver o papel,antes novinho,agora desgastado pelo tempo e me lembrar que o tempo passa sem nos darmos conta,e que assim como aquele papel mudou e ganhou marcas do tempo o mesmo aconteceu comigo e com todos.
Então eu me lembro que são raras as pessoas que fazem isso nos dias de hoje,e me faço essa mesma pergunta: “Onde estão os bardos?”