Mulheres que cantam para Mulheres

Por:

Por Robson Cardoso dos Santos

A MPB conta com um leque significativo de canções belíssimas, que emocionam pela sua simplicidade e leveza aérea, e não tanto pela técnica de sua composição. Boa parte dessas obras recebeu nomes de peso como suas intérpretes as quais, vale ressaltar, são mulheres de poderosas vozes aveludadas que afinam a melodia de seu coração… para outras mulheres.

Se Xena e Gabrielle pudessem contar com melodias pessoais para ilustrar seu amor, certamente encontrariam uma identificação épica com nossas cantoras da música brasileira.

Então, nesse limiar de Grécia e Brasil…

 

Adriana Calcanhoto

 

 

Sou Sua”

 

Sou sua luz

Sou sua cruz

Sou sua flor

Sou sua jura

Sou sua cura

Pro mal do amor

Sou sua foz

Sou sua fonte

Sou sua ponte

pro além de nós

Plenamente

Simplesmente.

 

Esta canção remete ao que por muito tempo ficou implícito na série: Xena e Gabrielle exclusivamente pertenciam uma à outra, e isso não se devia apenas ao caráter espiritual-kármico do romance. A química, o respeito mútuo, a admiração recíproca sem nenhuma abrir mão de seus princípios de vida, um laço tão harmônico, de duas pessoas que sabem reconhecer que são dois opostos que se integram num terceiro.

 

Ana Carolina

“Poema: Te Olho Nos Olhos”

 

Te olho nos olhos e você reclama

Que te olho muito profundamente.

 

Desculpa,

Tudo que vivi foi profundamente…

Eu te ensinei quem sou…

E você foi me tirando…

Os espaços entre os abraços,

Guarda-me apenas uma fresta.

Até onde posso ir para te resgatar?

Reclama de mim, como se houvesse a possibilidade…

De me inventar de novo.

Desculpa…se te olho profundamente,

Rente à pele…

A ponto de ver seus ancestrais…

Nos seus traços.

 

A ponto de ver a estrada…

Muito antes dos seus passos.

 

Eu não vou separar as minhas vitórias

Dos meus fracassos!

 

Eu não vou renunciar a mim;

 

Nenhuma parte, nenhum pedaço do meu ser

Vibrante, errante, sujo, livre, quente.

 

Eu quero estar viva e permanecer

Te olhando profundamente.

 

Esta música tem um espírito duplo tão forte! Fala de uma Xena retraída pelo interesse de Gabrielle por ela… Fala de uma Gabrielle de olhar analítico, de uma Xena que tenta mudar mas que é orgulhosa demais pra admitir que precisa de ajuda para incorporar o novo molde. Uma Xena que foi permitindo-se ser explorada, uma Gabrielle que pôde, então, lapidar o lado branco da guerreira má. Tanto Xena quanto Gabrielle não renunciaram a si mesmas para andarem em aventuras por aí… Elas abriram mão da família, da vida que esperavam que elas vivessem, para encontrar o imenso significado da existência dentro dos pequenos atos cotidianos… juntas nos erros, nos risos, na tão necessária presença e do calor humano de alguém que amamos.

 

Cássia Eller

 

“Malandragem”

 

Quem sabe eu ainda sou uma garotinha

Esperando o ônibus da escola sozinha

Cansada com minhas meias três-quartos

Rezando baixo pelos cantos

Por ser uma menina má

Quem sabe o príncipe virou um chato

Que vive dando no meu saco

Quem sabe a vida é não sonhar

 

Eu só peço a Deus

Um pouco de malandragem

Pois sou criança e não conheço a verdade

Eu sou poeta e não aprendi a amar

 

Bobeira é não viver a realidade

E eu ainda tenho uma tarde inteira

Eu ando nas ruas, eu troco um cheque

Mudo uma planta de lugar

Dirijo meu carro

Tomo o meu pileque

E ainda tenho tempo pra cantar…

 

Aqui, temos um vislumbre do marasmo que era a vida de Gabrielle em Potédia, presa entre afazeres domésticos e a promessa de matrimônio com um homem com quem ela nada tinha em comum. Imperava na jovem aquela chama de buscar, conhecer, abrir asas e voar. Aquilo não era a realidade. Afinal, tudo que Gaby pedia aos deuses era “um pouco de malandragem”, e ela foi malandra o suficiente pra escapar de Potédia, indo atrás da Princesa Guerreira.

 

Gal Costa

 

Quando Eu Fecho os Olhos”

 

E aí você surgiu na minha frente

E eu vi o espaço e o tempo em suspensão

Senti no ar a força diferente

De um momento eterno desde então

E aqui dentro de mim você demora

Já tornou-se parte mesmo do meu ser

E agora, em qualquer parte, a qualquer hora

Quando eu fecho os olhos, vejo só você..

 

 

Juras de amor entre Xena e Gabrielle foram várias, e cada uma foi unicamente marcante. Essa composição retrata com cores vivas todas as lágrimas que xenites derramaram ao longo de 6 anos (e ainda derramam), desejosos de terem para si um amor igual àquele de suas heroínas.

 

Joanna

“Ouvindo Estrelas”

 

Quando a gente está amando, pode ouvir estrelas

Pode ser poeta, pode andar sonhando

Adormecer na rua e acordar na lua…

Quando estou com você, é pra valer, muito demais

quem é que sabe o que faz…

E a gente, deixa o coração querer, deixa tudo acontecer

no mundo não há bem nem mal, é tudo natural…

 

Lembraram da cena final de “A Day in the Life”? Xena e Gabrielle procurando desenhos nas estrelas? Cena parecida aconteceu no final de “Kindred Spirits”, dessa vez com Eve entre as “mamães”.

 

Maria Bethânia

 

“Minha Namorada”

 

Você quer ser minha amada, minha amada, mas amada pra

valer

Aquela amada pelo amor predestinada

Sem a qual a vida é nada, sem a qual se quer morrer

Você tem que vir comigo em meu caminho

E talvez o meu caminho seja triste pra você

Os seus olhos tem que ser só dos meus olhos

Os seus braços o meu ninho no silêncio de depois

E você tem que ser a estrela derradeira

Minha amiga e companheira

No infinito de nós dois…

 

Uma letra como essa espelha o que todo subber gostaria de ter visto explícito na série: um pedido oficial de namoro entre Xena e Gabrielle! Narra também o dilema do “Caminho”, onde a guerreira sabia que seu caminho não faria bem para sua barda, se o trilhassem juntas… mas, mesmo assim, “egoistamente” apaixonada, sequer podia imaginar uma estrada sem sua alma-gêmea ao seu lado. A companheira, a derradeira…

 

Marina Lima

“Anna Bella”

 

Eu vi no mapa do mundo

Que Anna Bella desenhou

Que a região do desejo não é exatamente a do amor

 

Já que é assim, me pergunto

Por que as mulheres também não podem ter a sua sauna gay?

 

Mais direta do que Marina Lima não há: direitos iguais para as mulheres homossexuais! E lembremos dos banhos de Xena e Gabrielle juntas, em “Altared States, “A Day in the Life” e “Legacy”, por exemplo.

 

 

Zélia Duncan

“Alma”

Alma!

Deixa eu ver sua alma

A epiderme da alma

Superfície!

Alma!

Deixa eu tocar sua alma

Com a superfície da palma

Da minha mão

Superfície…

 

Podemos conectar esta música ao rostinho avidamente curioso de Gabrielle na 1a Temporada, louca de vontade de desvendar aquele belo enigma de olhos azuis, rompendo camadas até atingir seu núcleo, sua alma. E, de fato, ela conseguiu.

_

 

 

Todo mundo lembra de alguém, de algum momento, quando escuta uma música em especial. Isso de nostalgia, de saudade, é o que temos de mais humano, e tão divino é brindar tais lembranças, sejam boas ou ruins, ao som de uma bela canção, cantando só de meias em cima da cama, ou usando o shampoo como microfone debaixo do chuveiro. Espantando os males, enfim.

VN:F [1.9.22_1171]
Rating: 0 (from 0 votes)
Be Sociable, Share!

Leave a Reply