É uma verdade universalmente conhecida…
Por: Colaboradores
Girl Power n. 30
Duas Girl Powers em uma! Junte a personalidade à espada!
Texto e imagens: Cristina Bordinhão
Revisão e apoio: Alessandro Chmiel
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer ao Alessandro por ter me disponibilizado este espaço pra falar um pouquinho sobre minha personagem literária favorita. Espero que aproveitem!
“É uma verdade universalmente conhecida que um homem solteiro, possuidor de uma boa fortuna, deve estar necessitado de uma esposa.”
É com tal afirmação que a narração de Orgulho e Preconceito começa, abrindo espaço para que as personagens sejam introduzidas já em um ambiente pré-determinado pela posição social garantida em um bom (ou mau) casamento. A Inglaterra vitoriana (séc. XVIII-XIX) é palco das peripécias da excêntrica família Bennet, da onde se destaca nossa girl power desse mês, que atende pelo nome de Elizabeth Bennet.
Lizzy (como é carinhosamente chamada pelos amigos), segunda filha mais velha dos Bennet, a mais sagaz, inteligente e sarcástica das cinco, se encontra como uma figura contra a corrente de uma Inglaterra vitoriana na qual a mulher nada mais era do que um “enfeite” e progenitora de filhos, sem direito algum a dinheiro ou propriedades. No clã Bennet, então, a situação era mais grave: como a Mrs. e o Mr. Bennet não tiveram nenhum filho homem, todos os bens da família seriam confiscados após a morte do patriarca, deixando as seis mulheres “sem eira nem beira”. A “solução” para tal seria um marido rico para as filhas.
Lizzy se encontra em uma sinuca de bico quando o excêntrico e prolixo Mr. Collins faz a temida proposta à nossa heroína: ou ela o aceita e livra a família de problemas com dinheiro (além de não tornar-se “a tia encalhada”), ou vai contra o “bom-senso”, uma vez que, com a recusa do casamento, a família encontra-se fadada à miséria no momento em que a figura paterna sumir. Além de tudo isso, sua irmã mais velha apaixona-se por um jovem rapaz cheio da grana, Charles Bingley: tudo parece perfeito até ele simplesmente sumir do mapa e fugir do compromisso. Quer mais? O melhor amigo de Bingley, o misterioso Mr. Darcy, torna-se alvo de comentários pelo seu jeito casmurro e fechado (e também por ser charmoso, milionário e não procurando uma esposa), atraindo a atenção da jovem Elizabeth – que, por ter um temperamento forte e julgar as pessoas rapidamente, o vê como um chato, arrogante, orgulhoso e preconceituoso. O que ele fez pra merecer isso? A desprezou. Pobre Mr. Darcy.
Em um enredo cheio de reviravoltas, nossa heroína se encaixa de forma surpreendente, expressando seu ponto de vista através de atitudes polêmicas e cheias de vigor. Ajuda a sua irmã a encontrar o amado, sem pensar nas consequências dos atos, briga com a amiga Charlotte Lucas por ter se casado sem nenhum interesse amoroso, briga com a mãe por não querer casar-se por dinheiro, enfim, não tem medo algum de assumir publicamente suas opiniões, tão avançadas para a época em que vivia. Chegando ao final da história podemos perceber que as atitudes tomadas por Lizzy são apenas fruto de seus impulsos, guiados apenas pelo amor e uma tentativa de fazer as pessoas ao seu redor serem mais felizes. Como uma boa história de Jane Austen, apesar de todos os infortúnios o final se revela de maneira divertida, esclarecedora e feliz.
Tá achando a história complicada? Cheia de detalhes? E se, além de tudo isso, eu te pedir pra juntar zumbis ao enredo? Foi assim que “Orgulho e Preconceito e Zumbis” (Pride and Prejudice and Zombies, Quirk Ed., 2009, 320p.) nasceu, de acordo com seu criador, Seth Grahame-Smith. O enredo é o mesmo, só que dessa vez a Inglaterra vitoriana é infestada com uma praga que transforma seres humanos em zumbis famintos por cérebros. Elizabeth e suas irmãs são caça-zumbis, que, treinadas pelo pai, defendem seu vilarejo contra os mortos-vivos.
Nossa heroína permanece com sua opinião implacável e seu intensificado senso de julgamento de pessoas. Adicione a essa personalidade marcante uma espada e saiba que muitas cabeças irão rolar e muitos corações serão arrancados (literalmente e figurativamente). Lizzy não aceita a sociedade como é e faz de tudo pra mostrar que as mulheres têm um espaço mais do que garantido na Inglaterra vitoriana. Nosso amigo, o rejeitado Mr. Darcy, aparece nessa versão como o matador de zumbis mais famoso do sul do país, deixando assim Lizzy com ciúmes e com a espada na mão.
Em uma narrativa nua e crua, cheia de descrições, a história desenrola-se, mostrando o lado sombrio das personagens da comédia romântica de Jane Austen. A tia do Mr. Darcy, tida apenas como uma pessoa rancorosa e fria, que demonstra não ter sentimentos bons pela mocinha Bennet, na versão “zumbizada”, é uma mestre nas artes marciais, com uma horda de ninjas prontos para defendê-la. Juntando uma tia superprotetora e uma heroína hiperativa, o que temos? Fight! A cena de luta entre as duas com suas katanas pode ser comparada com a briga da Noiva com Elle em Kill Bill. Sangue, golpes inusitados e frases de efeito não faltam!
Entre idas e vindas, zumbis dilacerados, descrições sanguinolentas e casamentos feitos e desfeitos, nossa heroína descobre o amor em meio ao campo de batalha e, entre encontros e desencontros, Lizzy coloca toda a sua força de vontade em destroçar zumbis e proteger a família. Dentro do coração dessa guerreira existe amor para dar e vender, o problema é saber procurar e chegar e acertar o ponto exato da doçura de nossa heroína, disponível para poucos e fieis amigos. (Isso é Xena, não? – por Alê!)
Enfim, nossa heroína vitoriana é exemplo de Girl Power até os dias de hoje por sua personalidade e fidelidade inabaláveis, assim como um coração gigante e sempre uma resposta na ponta da língua. Não importa se esteja matando zumbis ou não, Lizzy sempre será um ícone do seu tempo, uma personagem anacrônica que consegue ser atual em qualquer época onde possa estar inserida.
LEIA!
Jane Austen. Orgulho e Preconceito. L&PM Editores, 2009. Aprox. R$25
Jane Austen e Seth Grahame-Smith. Orgulho e Preconceito e Zumbis. Ed. 2010. P. aprox. R$30
P.S. As imagens de “Orgulho e Preconceito” que utilizei nesse artigo vêm da versão fílmica de 2005, produzida pela Universal e estrelando Keira Knightley. Pra saber quem mais já foi Elizabeth Bennet seja na telinha ou na telona, acesse http://www.imdb.com/character/ch0003183/ (tem até Lizzy de Bollywood em versão musical!). Já as imagens de “Orgulho e Preconceito e Zumbis” são as ilustrações originais do livro, desenhadas por Philip Smiley.
ASSISTA!
Orgulho e Preconceito – 1994 – série clássica da BBC estreando Jennifer Ehle e Colin Firth.
Orgulho e Preconceito – 2005 – filme da Universal estreando Keira Knightley e Matthew MacFadyen
Noiva e Preconceito (Bride and Prejudice) – versão musical Bollywoodiana do livro!