Subtexto:Uma análise.

Por Mary Anne
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Talvez um dos temas que mais gere discussão dentre o fandom Xenite seja o tão citado subtexto.
Inicialmente, é necessário considerar que, subtexto por definição é aquilo que não fica explicitamente expresso no texto principal, seja qual for a natureza do mesmo.Dessa forma, estamos constantemente expostos à subtextos no mundo da arte.Ao interpretarmos um poema da Literatura Antiga, como Anacreonte, por exemplo, buscamos a mensagem que para nós não fica clara logo de primeira, logo, se interpreta o subtexto do poema.Dessa forma, pode-se também considerar subtexto, qualquer informação subentendida ou impícita na obra.
Na metalinguagem do fandom xenite, subtexto, no entanto, é sinônimo de qualquer pista do relacionamento romântico das protagonistas da série, sendo assim a informação subentendida a ser interpretada, o romance.
Nessa sessão do site, já existem diversos documentos apontando os subtextos contidos em cada temporada, bem como fotos que têm objetivo passar a mensagem que ficou além do texto, explicitada por gestos, atos e expressão corporal.No entanto, o objetivo desse artigo é dar uma visão crítica e geral das discussões ao qual o tão citado subtexto dá origem.Procura-se também tentar chegar à uma resposta pra a razão de tantas perguntas que pipocaram em revistas, artigos, sites, fóruns e comunidades que abrangeu esse fandom: “Xena é lésbica?”, “Elas são ou não são?”, “Amizade ou relacionamento romântico?”.

Introdução


Talvez o ponto inicial seja explicar qual a origem do subtexto, ou seja, como ele surgiu na série.A série Xena Warrior Princess, é o que pode-se chamar de Spin-Off.Ou seja, uma série que teve a origem em outra, sendo assim um subproduto.Em 94, dois produtores executivos, Sam Raimi e Rob Tapert tentavam fazer dar certo o que consideravam o produto promissor para a Ren Pictures, Hercules The Legendary Journeys (doravante HTLJ).Eis que na série de Hércules é inserida uma vilã sem escrúpulos, chamada Xena, a qual foi convertida para o lado branco da força pelo protagonista de HTLJ.
Tendo a personagem o seu desfecho, Tapert teve a idéia de criar uma série para aquela anti-heroína que tinha caído na graça do povo.Raimi, por sua vez, afirmava que isso nunca daria certo, mas para nossa sorte, ele estava errado, e Tapert era persistente.Nasce assim, Xena, a Princesa Guerreira.O foco inicial, era de que a série falaria sobre uma guerreira arrependida dos pecados do passado que busca pela redenção enquanto entra em aventuras das mais variadas.Basicamente, um Hércules de saias, que supostamente teria tantos envolvimentos na série quanto o seu colega.Porém, no primeiro episódio da série apareceu uma loirinha, chamada Gabrielle, que estava prevista para morrer no segundo episódio.Mas como a loirinha de sorriso angelical havia agradado ao público e demonstrado talento, resolveram mantê-la na série, pois assim como Hércules tinha seu chaveirinho, Iolaus, Xena também teria a sua.
O motivo de tais explanações é deixar claro que até este ponto, os produtores não tinham intenção nenhuma de criar uma personagem que tivesse um relacionamento homo-afetivo com sua ajudante.No entanto, a química entre Lucy Lawless e Renee O’Connor foi tão grande e as duas pareciam tão bem juntas, que um grupo peculiar de fãs começou a ver coisas a mais na série.Logo, grupos GLS passavam a se reunir nos bares para assistir a série, dando uma audiência extra ao que de começo era apenas um experimento, filmado com restos de cenários de HTLJ.
Percebendo o rumo que as coisas haviam tomado, e que isso agradava a esse público, as atrizes passaram a inserir certos ‘cacos’ nas cenas.Os produtores da série (The Powers That Be, doravante TPTB) perceberam que o elo entre Xena e Gabrielle havia passado pelo aval das demais audiências e que seria uma boa jogada aproveitar esse gancho.
No entanto, aquela era a década de 90, mais precisamente o ano de 95.The L Word não era um sucesso, e sequer existia, filmes como Brokeback Mountain não eram indicados à Oscar, não saiam resenhas sobre Lost and Delirious nas revistas para adolescentes e, à nível de Brasil, a rede Globo ainda ‘matava’ as personagens lésbicas de suas novelas, se elas não agradassem.De modo geral, não se podia e nem se queria ousar, afinal aquela era considerada uma série “família”, e a melhor escolha era que agradasse a todos os tipos de público.Deste modo, o artifício utilizado foi o subtexto, implantado ainda no final da primeira temporada.
Talvez o fator que deixou esse subtexto mais declarado, tenha acontecido na segunda temporada, quando a série ganhou uma atenção maior por parte dos TPTB, que passaram a investir mais na produção e a dar um aspecto mais sério e dramático à trama.Os roteiros não traziam mais problemas resolvidos num único episódio, como salvar uma aldeia ou deter um warlord mau caráter.Um aspecto mais complexo havia sido implantado.E então, vai ao ar o episódio The Quest, onde há o tão comentado beijo entre as protagonistas.A ousadia, tinha como base a garantia de que mesmo que o público não acreditasse que Gabrielle estava na verdade beijando Autólycus (o que de fato, não faz o menor sentido), Xena estava num plano espiritual, logo, supostamente não havia nenhum contato "carnal" entre ambas.Porém, isso foi o suficiente para que a cena em questão se tornasse o emblema favorito dos subbers¹.

O problema que os TPTB arranjaram, era que a partir deste momento, parcela do público esperava por mais, e pelos motivos que já conhecemos, os produtores não estavam preparados para isso.Embora o subtexto fosse mantido, não teríamos outra cena de tanto impacto tão cedo.Com a chegada da terceira temporada, subbers afoitos enchiam listas de discussão, fóruns e chats com os questionamentos que já conhecemos.Até que veio o rift, aquele período de tensão emocional entre as personagens.Apesar das suposições de que o rift diminuiria o teor subtextual dos episódios, não foi o que aconteceu.Mesmo numa temporada de conflitos de amor e ódios, tivemos episódios como The Bitter Suite, One Against An Army, e Sacrifice II, este último no qual Gabrielle num ato de sacríficio, atira-se num fosso de lava com Esperança para salvar a vida de sua "amada amiga".

O que uma parcela do fandom não sabe, é que essa cena supostamente marcaria o fim da alegria dos subbers, uma vez que era previsto que a personagem permanecesse morta.Renee O'Connor não estava contente com o rumo que sua personagem tomava e pensava até em desistir de atuar, assim sendo, sairia da série.Porém nesse meio tempo os TPTB "viram a luz", e perceberam que naquela altura dos acontecimentos, a saída da personagem desagradaria profundamente os fãs da série.Lucy Lawless também teve sua parcela nisso, exigindo que Gabrielle tivesse um destaque maior na trama, deixando de ser simplesmente uma ajudante, e que o nome de Renee, também aparecesse com destaque nos créditos.O começo da quarta temporada quase fez os fãs, subbers e não subbers infartarem, uma vez que nem a personagem apareceu no episódio de abertura, nem seu nome nos créditos.Felizmente, foi apenas um susto, pois logo percebemos que de fato, Gabrielle não havia morrido no finale season da terceira temporada.

Na quarta temporada, um novo aspecto desse relacionamento é implantado na trama: a questão espiritual, o que nos apresenta o conceito das almas gêmeas. Do meu ponto de vista, essa foi uma das grandes jogadas dos TPTB, pois desse modo eles poderiam continuar com o tão adorado subtexto, sem correr o risco de banalizar esse aspecto do relacionamento das personagens.Esta temporada, é marcada por uma busca espiritual de ambas que descobrem que suas almas estão ligadas em vidas passadas e futuras, formando uma espécie de equilíbrio, ou seja, como almas gêmeas que devem percorrer o mesmo caminho.O final dessa temporada é novamente dramático, uma vez que após Gabrielle abandonar os modos pacíficos que havia adotado para tentar salvar uma Xena debilitada, ambas são crucificadas juntas, a mando de César.Após o episódio em questão, a temporada termina com um episódio que se passa nos dias atuais, onde ficamos sabendo que Xena reencarnou no corpo de um homem e Gabrielle, como uma terapeuta de vidas passadas, e como almas gêmeas, ambos descobrem que têm de ficar juntos.

Diversos rumores (alimentados também pela gravidez de Lucy Lawless) afirmam que essa era para ter sido a temporada final da série, porém os fãs queriam mais, e os TPTB espertamente atenderam, fazendo assim a quinta temporada.Esta temporada no entanto freqüentemente é denominada nos fóruns estrangeiros por um nome bastante curioso : "Snubtext".A expressão se trata de um trocadilho com a palavra "Subtext", uma vez que o termo "Snub" significa "parada repentina", "censura", "repreensão".

Ao ler isso, certamente quem ainda não assistiu tal temporada deve estar pensando, "Peraí, mas isso quer dizer que eles tiraram o subtexto da quinta temporada?".Não exatamente.O fato, é que essa temporada tanto em questão de subtexto quanto de um modo geral tem um aspecto distorcido, causado por diversos fatores: Saída dos antigos roteiristas, entrada de um novo pessoal na produção, a gravidez da protagonista que deu origem à gravidez da personagem também, entre outros.Isso fez com que dentre as seis temporadas da série, essa apresentasse os menores índices de audiência.Tapert, ao ser entrevistado por Rudnick, redator do site Whoosh foi perguntado sobre O que os roteiristas estavam pensando ao escrever a quinta temporada? A resposta é bastante esclarecedora, "Eles não estavam pensando" afirma Tapert.

No entanto, tais considerações não podem levar o público acreditar que a quinta temporada seja um verdadeiro lixo (embora muitos a denominem desse modo).Mas afinal, qual são os pontos negativos e positivos, e o que aconteceu com o subtexto no meio disso tudo?

Vamos por partes.Como pontos negativos, os mais apontados são episódios 'surreais'.Tudo começa quando fazem uma Xena grávida voltar a China por causa de sua antiga mentora, Lao Ma.Além de colocarem Xena para ganhar uma guerra usando poderes inacreditáveis, no maior estilo de animes japoneses, ainda subentendem Lao Ma, uma personagem antes fortemente ligada ao subtexto, como uma espécie de figura materna para Xena, o que não faz o menor sentido em relação aos episódios The Debt, da terceira temporada, onde a personagem aparece inicialmente.Em seguida, é apresentado um musical que apesar de razoavelmente divertido, em relação à The Bitter Suite, decaiu muito em qualidade.Mais à frente, vem a catástrofe geral da quinta temporada, o episódio intitulado "Married with Fishsticks" com uma história bizarra e surreal onde Gabrielle sonha que é uma sereia que tem filhos monstros e é casada com Joxer.Mas as coisas não param por aí.Logo a seguir, vem "Lifeblood", episódio que mescla cenas do piloto de uma nova série chamada Amazon High, onde Xena e Gabrielle mal aparecem.Juntamente dos pontos negativos, já podemos citar os episódios "snubtexters" também : Primeiramente, nos episódios da China, tentam fazer a personagem Gabrielle se envolver com um guerreiro chamado Lin Qi.Para a sorte dos subbers, eles tinham uma aliada, Renee O'Connor, que bateu o pé e mandou cortar a cena do envolvimento dos personagens afirmando que aquilo não seria correto para Gabrielle.Em seguida, os roteiristas (que não estavam pensando) têm a bela idéia de implantar no roteiro de Eternal Bonds um beijo entre Joxer e Gabrielle.Mais uma vez, Renee 'roda a baiana' e pede intervenção até de Robert Tapert para que a cena não seja gravada, e felizmente consegue.Porém, em seguida vem a bomba da temporada, o episódio Antony and Cleopatra, onde Xena, disfarçada de Cleopatra, leva adiante um plano no qual tem de se envolver com Antony, fazendo com que esse seja o episódio da quinta temporada que mais gera revolta nos fãs subbers.

O leitor que ainda não viu essa temporada deve estar novamente pensando, mas afinal, a quinta temporada tem algo que preste?Como já citamos, a temporada não é nenhum lixo.Há episódios de qualidade e com boas histórias, por incrível que pareça, há bastante subtexto, mostra um amadurecimento enorme de Gabrielle que se torna uma verdadeira guerreira, protetora em relação à uma Xena mais frágil pela gravidez e batalhas olímpicas.

Porém, o maior problema que fãs subbers e não subbers vêem nessa temporada de modo geral, é que todo o foco ficou na gravidez de Xena e no fato dos Olímpicos quererem acabar com a vida do bebê.Somado a isso, subbers alegam que em tal temporada, Xena não deu atenção à Gabrielle, negligenciando sua segurança e a 'relação' de ambas.Pessoalmente, 'neglicenciar a segurança' não é exatamente o ponto principal, afinal não esperávamos que a personagem ficasse a série inteira precisando da ajuda de Xena para sair das encrencas, não é?A personagem merecia destaque, amadurecimento e independência, e foi isso que essa temporada mostrou.

Percebendo a visível queda de audiência nesse período, os TPTB, assim como nossa heroína precisavam se redimir, e após Tapert e Raimi, que haviam perdido muito dinheiro em projetos frustrados como Cleopatra 25 25 e Jack of All Trades, convencerem uma Lucy cansada e estressada a gravar mais uma temporada, eles resolveram apostar todas as fichas na temporada final, inclusive no subtexto (porém obviamente até uma linha que não podia ser cruzada por motivos de censura da Universal).

Na sexta temporada, o subtexto por diversas vezes se tornou o chamado "maintext", ou seja, saiu do subentendimento para ficar 'quase' explícito.O conceito das almas gêmeas, não citado na quinta temporada, é retomado com força numa trilogia que retrata a mitologia nórdica e temos "When Fates Collide", episódio após assistido deixa poucas chances para um ceticismo em relação ao aspecto romântico da relação de ambas.Esses e outros fatores citados mais à frente fizeram com que a temporada final de XWP, fosse a mais amada entre os subbers.

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¹ - São considerados Subbers ou Subtexters aqueles fãs que acreditam no aspecto romântico do relacionamento de Xena e Gabrielle.